A vida em São Paulo é uma completa bagunça. É o trânsito, o corre-corre do dia a dia, a alimentação escassa pelo pouco tempo restante. Um clima de estações diárias que não se decide se faz chuva, calor ou se resfria a alma de seus habitantes.
E no meio desse caos diário meu corpo sucumbiu. Eu sabia os porquês e ignorei totalmente. Segui a vida sempre pensando “daqui a pouco eu vejo”. Contas e contas chegando, prazos apertados, simplesmente não me senti no direito de parar e descansar um pouco. E o resultado foram alguns dias em descanso, litros de soro e muitas pílulas mágicas que me faziam ver colorido.
No meio dessa bagunça Dona Pimenta estava enfezada. A situação não lhe agradava. Ela odiava hospitais e não se conformava com a situação. Nas poucas visitas em que veio, era sempre do mesmo jeito. A cara emburrada, com visitas de 20-30 minutos, sempre questionando as minhas escolhas que me levaram lá.
E foi nesta última segunda que tentei fazer algo que há tempos não fazia. Liguei para alguns amigos, cobrei alguns favores, perdi quase a paz da manhã inteira correndo atrás do que eu precisava. Por sorte minha irmã iria me visitar e se prontificou a trazer o que eu precisava.
E foi as 20h daquela noite. Eu estava sentado no sofá assistindo alguma bobeira da TV quando ela chegou. Entrou pela porta do quarto timidamente. Sua feição se dividia entre nervosismo e preocupação. O cansaço do dia era visível em casa movimento que fazia.
Eu apenas sorria. Adorava aqueles olhos grandes e negros, que faziam par perfeitamente à aqueles cabelos castanhos. Sem entender, ela vinha à minha direção. Me deu um beijo, tirou o casaco e só quando foi colocar sobre a cadeira que percebeu. Sobre mesa, um bouquet de Girassóis repousava junto a chocolates e um cartão.
“Seu palhaço! Você deveria estar descansando!”
Foi a primeira coisa que disse enquanto abria um sorriso enorme. As feições anteriores se apagavam enquanto lágrimas escorriam lentamente enquanto ela lia o cartão. Seus olhos, brilhavam como estrelas e agora o silêncio ocupava todo espaço do quarto.
Veio então ao meu encontro e me deu um beijo. Dessa vez mais carregado e ao mesmo tempo suave, como uma pluma bailando no ar indo de encontro à água do lago. E foi nesse momento que eu percebi onde foi que eu me apaixonei. E foi nesse momento que decidi encerrar com meu vício.