Nascemos números, somos números, vivemos números. Assim é a sociedade. Ninguém para no meio da avenida e olha a sua volta, imaginando a vida de cada um. Todos apenas seguem com sua vida pacata, indiferentes uns aos outros, mesmo que a pessoa ao lado esteja sendo assaltado na hora. E o pensamento é comum, apenas um “Não é comigo”.
No meio dessa multidão, caminha Marry. Uma jovem de 26 anos, fazendo sua segunda graduação, agora em direito por uma faculdade famosa em São Paulo. Capricorniana, de descendência asiática e nordestina, geniosa, turrona, meio menina, meio mulher, mas puro sentimento.
Quem a vê, apenas olha uma bela mulher, quase sem traços orientais, lindos cabelos castanhos, junto a uma pele levemente bronzeada e olhos que mal lembram suas origens. Voz rouca e doce, delicada, mas extremamente decidida. Sabe o que quer e luta por suas crenças. E por trás desta rocha, um coração de ouro, à espera de quem o mereça e o tome para si.
Na adolescência, se apaixonou perdidamente. Não havia maturidade, nem tempo. Apenas uma vontade louca de se verem e se entregarem um ao outro. E o romance que parecia ser capítulo de novela das 8h, acabou na separação.
Anos depois, ela com seus poucos mais de 20 anos, ele com seus 22, acabaram por se encontrar. Encontro marcado, pedido dele, local dela. E mesmo que o tempo possa dividir o destino e apaziguar as tormentas, à primeira vista, foi como se nunca tivessem se separado. Foi como se o passado tivesse se tornado ontem. E novamente, o romance aconteceu.
O resultado deste romance foi um fim de ano inconsequente. Nem mesmo a pílula do dia seguinte pode evitar que Marry engravidasse. Ele por sua vez, não foi cafajeste, foi covarde. Jogou nas costas dela todas as decisões e ele apenas acataria. O resultado, foi uma jovem inexperiente, mergulhada em um coquetel de hormônios e sentimentos, sozinha, desesperada, sem ter uma mão em seu ombro dizendo “está tudo bem”. E o feto foi abortado.
Hoje, ela vive as consequências. Descobriu Lúpus em sua vida. E mesmo que queira ter um filho hoje, as possibilidades são baixas, mesmo com um tratamento intensivo para tal. Hoje se arrepende pelo ato do passado, e tenta diariamente se perdoar pela atitude tomada na época.
De tantas dores que o ser humano pode sentir, a dor do arrependimento é a mais fatal. Não retira pedaço, não lhe faz sangrar. Mas fere na alma profundamente. E não há punição maior que viver diariamente, pois ao olhar no espelho, o culpado sempre estará lá.